Equipe internacional encontra presença de gás fosfina, produzido por bactérias que vivem em ambientes inóspitos, na atmosfera de Vênus, assim anunciaram ciêntistas nesta segunda-feira, um forte indicador da presença de vida no planeta. As evidências foram publicadas no periódico científico Nature Astronomy.
Na Terra, o composto químico é produzido por bactérias que vivem em ambientes com escassez de oxigênio, como é o caso da atmosfera venusiana.
A existência de vida extraterreste é um dos maiores questionamentos da ciência. A descoberta do gás fosfina em Vênus foi feita por um time internacional de cientistas no Telescópio James Clerk Maxwell, no Havaí, e confirmado por meio do rádiotelescópio Alma, no Chile. Esta é a primeira vez que este composto é descoberto em um planeta telúrico do Sistema Solar, com exceção da Terra.
O gás, formado pela combinação de fósforo com três átomos de hidrogênio, é considerado altamente tóxico para seres humanos. A concentração encontrada na atmosfera de Vênus é de 20 partes por bilhão.
A ciêntista Jane explica que os pesquisadores avaliaram possíveis fontes não biológicas, como atividade vulcânica, meteoritos e diversas reações químicas, mas nenhuma pareceu viável. As pesquisas continuarão com o intuito de confirmar a presença de vida no planeta ou encontrar uma explicação alternativa.
Com base no que sabemos sobre Vênus, a explicação mais plausível para a presença do gás fosfina, por mais fantástica que pareça, é a presença de vida — disse Clara Sousa-Silva, portuguesa de 33 anos, co-autora e astrofísica molecular do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (EUA). — É preciso enfatizar, no entanto, que a hipótese de vida (extraterrestre) deve ser encarada como o último recurso. A descoberta é importante porque, se for o caso, isso significa que não estamos sozinhos e que a vida por si só pode ser muito comum. Pode haver vários outros planetas habitados em nossa galáxia.
Vênus é o planeta mais próximo da Terra. É similar em estrutura, embora ligeiramente menor, e é o segundo planeta mais próximo do Sol, enquanto a Terra é o terceiro. A atmosfera venusiana é tóxica e densa e retém o calor. A temperatura na superfície chega a 471°C, o suficiente para derreter chumbo. A pressão atmosférica é 90 vezes maior do que a terrestre
— Nenhuma forma de vida poderia sobreviver na superfície de Vênus, que é completamente inóspita, até mesmo para bioquímicas completamente diferentes das nossas. Mas o planeta pode ter tido vida há muito tempo atrás, antes do efeito de gás estufa deixar a maior parte da superfície completamente inabitável — completou Clara.
Nuvens ácidas
A hipótese de vida em Vênus é antiga e já foi levantada por diferentes astrônomos como Carl Sagan, morto em 1996. No entanto, a maioria dos cientistas se concentrou em outros planetas, como Marte, e luas como Europa (Júpiter) e Encélado (Saturno). Embora tenha enviado sondas ao planeta batizado com o nome da deusa grega da beleza, a Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, deu bem menos atenção ao astro.
Alguns cientistas desconfiam que as nuvens altas do planeta, cuja temperatura gira em torno de 30°C, pode reunir micróbios aéreos capazes de sobreviver à extrema acidez — elas são formadas em boa parte por ácido sulfúrico, que compõe 90% da formação destas nuvens. Micróbios terrestres não são capazes de resistir a esse nível de acidez.
Se forem micro-organismos, eles poderiam ter acesso a alguma luz solar e à água e talvez vivam em gotículas de água, o que impediria a desidratação. Mas isso exigiria algum mecanismo desconhecido para protegê-los da corrosão — disse Jane.
Na Terra, micro-organismos que vivem em ambientes anaeróbicos, ou seja, que não dependem de oxigênio, produzem fosfina. Algumas bactérias absorvem fosfato e produzem o gás fosfina a partir da combinação com o hidrogênio.
O composto também pode ser produzido por plantas de esgotos, pântanos, plantações de arroz, sedimentos lagunais e também é encontrado nos excrementos e no trato digestivo de vários animais, incluindo seres humanos. O gás fosfina também pode ser gerado artificialmente em alguns procedimentos industriais.
Vênus deveria ser um planeta hostil ao gás fosfina, já que sua superfície e sua atmosfera são ricas em compostos de oxigênio que rapidamente reagiria e destruiria o elemento.
— Alguma coisa parece estar gerando a fosfina em Vênus de maneira tão rápida quanto a destruição do gás — disse outra co-autora do estudo, Anita Richards, astrofísica da Universidade de Manchester (Reino Unido).
Para a astrônoma Diana Paula Andrade, do Observatório do Valongo, da UFRJ, a descoberta de fosfina em Vênus é marco importante na astrobiologia, mas a especulação sobre vida ainda é prematura. A cientista recorda como exemplo a descoberta de metano (molécula de carbono e hidrogênio) em Titã, lua de Saturno.
— Essa descoberta causou alvoroço em 2007 na comunidade cientifica. Ficaram especulando se não poderia ser algum organismo que liberava metano — conta.
— Mas quando começaram a estudar melhor Titã, a gente viu que o metano saiu de processos geológicos mesmo. É o ciclo de hidrocarbonetos de Titã que faz esse metano ir para a atmosfera. Não é necessário usar um micro-organismo para explicar o metano de Titã.
A astrônoma conta que a busca de fosfina é um alvo já consolidado na astrobiologia, e o aparecimento de substância em um estudo sobre Vênus não é uma surpresa total.
— A formação da fosfina no meio interestelar é prevista em reações que não têm barreira de ativação, epodem acontecer naturalmente — conta. — A fosfina já foi encontrada no envoltório cinrcunstelar (gás, poeira e asteroides em torno de estrelas) também.
Clara Sousa-Silva, porém, diz crer que a relativa proximidade de Vênus, que já recebeu sondas da Nasa, pode facilitar as investigações científicas para elucidar o problema.
Nós fizemos o melhor possível para explicar a descoberta sem a necessidade de ujm procedimento biológico. Com o nosso conhecimento atual a respeito da fosfina e de Vênus, bem como da geoquímica, não temos a resposta para a presença do gás nas nuvens do planeta. Isso não significa que há vida, necessariamente, mas que há um processo exótico produzindo fosfina, o que exige mais estudos — avaliou Clara. — Felizmente Vênus está 'logo ali'. Podemos literalmente investigar localmente.
No passado, houve missões do Programa Venera, da então União Soviética, em Vênus. Mas o principal desafio é garantir a operação de sondas, uma vez que metais derretem facilmente pelas temperaturas altíssimas . Atualmente, há apenas uma sonda na órbita do planeta, a japonesa Akatsuki, lançada em 2010.
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